Um dos maiores problemas de comunicação, tanto a de massas como a interpessoal, é como o receptor, ou seja, o outro, ouve o que o emissor, ou seja, a pessoa, falou:
Numa mesma cena de telenovela, notícias de telejornal ou num simples papo ou discussão, observo que a mesma frase permite diferentes níveis de entendimento.
Na conversação dá-se o mesmo. Raras, raríssimas são as pessoas que procuram ouvir. Diante desse quadro venho desenvolvendo uma série de observações e como ando bastante entusiasmado com a formação delas, divido-as com o competente leitorado que por certo me ajudará, passando-me as pesquisas que tenha a respeito.
Observo que:
- Em geral, o receptor não ouve o que o outro fala; ele ouve o que o outro não está dizendo.
- O receptor não ouve o que o outro fala; ele ouve o que quer ouvir.
- O receptor não ouve o que o outro fala; ele ouve o que já escutara antes e coloca o que o outro está falando naquilo que acostumou a ouvir.
- O receptor não ouve o que o outro fala. Ele ouve o que imagina que o outro ia falar.
- Numa discussão, em geral, os discutidores não ouvem o que o outro está falando. Eles ouvem quase que só o que estão pensando para dizer em seguida.
- O receptor não ouve o que o outro fala. Ela apenas ouve o que está sentindo.
- A pessoa não ouve o que a outra fala. Ele ouve o que gostaria de ouvir o que o outro dissesse.
- A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ela retira da fala da outra apenas as partes que tenham a ver com ela e a emocionem, agradem ou molestem.
- A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ela retira da fala da outra apenas as partes que tenham a ver com ela e a emocionem, agradem ou molestem.
- A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ouve o que confirme ou rejeite o seu próprio pensamento. Vale dizer, ela transforma o que está falando em objeto de concordância ou discordância.
- A pessoa não ouve o que a outra está falando. Ouve o que possa se adaptar ao impulso de amor, raiva ou ódio que já sentia pela outra.
- A pessoa não ouve o que a outra fala. Ouve da fala dela apenas aqueles pontos que possam fazer sentido para as idéias e pontos de vista que no momento estejam influenciando ou tocando mais diretamente. Esses doze pontos mostram como é raro e difícil conversar. Como é raro e difícil se comunicar! O que há,m em geral, ou são monólogos simultâneos trocados à guiza de conversa, ou são monólogos paralelos, a guiza de diálogo. O próprio diálogo pode se dar, sem que haja necessariamente comunicação. Pode haver até um conhecimento a dois sem que necessariamente haja comunicação. Esta só se dá quando ambos os pólos ouvem-se, não, é claro, no sentido de escutar mas de procurar compreender em sua extensão e profundidade o que o outro está dizendo.
Ouvir, portanto, é muito raro. É necessário limpar a mente de todos os ruídos e interferências do próprio pensamento durante a fala alheia.
Ouvir implica uma entrega ao outro, uma diluição nele. Daí a dificuldade de as pessoas inteligentes efetivamente ouvirem. A sua inteligência em funcionamento permanente, o seu hábito de pensar, avaliar, julgar e analisar tudo interferem como um ruído na plena recepção daquilo que o outro está falando.
Não é só a inteligência a atrapalhar a audiência. Outros elementos perturbam o ato de ouvir. Um deles é o mecanismo de defesa. Há pessoas que se defendem de ouvir o que as outras estão dizendo por verdadeiro pavor inconsciente de se perderem a si mesmas., Elas precisam “não ouvir”, porque “não ouvindo” livram-se da retificação dos próprios pontos de vista, da aceitação de realidades diferentes das próprias, de verdades idem e assim por diante. Não ouvir é, pois, sólido mecanismo de defesa.
Ouvir é um grande desafio. Desafio de abertura interior, de impulso na direção do próximo, de comunhão com ele, de aceitação dele como é e como pensa. Ouvir é proeza. Ouvir é raridade. Ouvir é ato de sabedoria.
Depois que a pessoa aprende a ouvir, ela passa a fazer descobertas incríveis, escondidas ou patentes em tudo àquilo que os outros estão dizendo a propósito de falar.
Arthur da Távola
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